Chuva torrencial, sprint de água no parabrisas provocado pela passagem dos outros carros que não te deixam enxergar nada, sinalização que confunde e requer total cautela para dirigir principalmente à noite, muitos desvios daqueles que se faz a 40km/h, breu total na maior parte do trecho, buracos e relevos em alguns trechos de toda a pista.
Mas as memórias e exemplos da BR-470 parecem não ter servido de lição para muitos motoristas que trafegam pela rodovia sentido Blumenau/litoral/Blumenau. Impacientes, eles ignoram as condições adversas, dirigem de forma agressiva, claramente acima da velocidade, colam atrás e ficam pressionando com farol de luz, ultrapassam praticamente às cegas nas curvas e fazem do trafegar pela BR-470 uma questão de vida ou de morte para depois culpar a rodovia.
Bastou uma viagem de volta da grande Porto Alegre e cidades vizinhas para começar a se fazer questionamentos profundos sobre como os motoristas conduzem as suas vidas e a dos outros pelas BRs 101 e 470. A chuva já vinha acompanhando desde a entrada na Freeway e engrossou até a chegada em Blumenau. Depois de passar a entrada para Ilhota decidi encarar o trecho da BR-470 e confesso que foi assustador.
O primeiro questionamento foi: se tanto a BR-101 quanto a 470 são rodovias federais, por que tanto descaso das autoridades com a 470 de um modo geral? Principalmente os trechos esburacados, sem sinalização, sem iluminação e com as placas sendo engolidas pela vegetação?
O outro questionamento continua sendo: o que explica o comportamento agressivo dos motoristas em condições absolutamente adversas: chuva torrencial daquelas de não enxergar nada, buracos, breu total, sinalização ruim em muitos trechos, sobretudo em obras e jatos de água dos outros carros no parabrisas que fazem dirigir às cegas por alguns segundos?
Lição não aprendida
O apelido já diz tudo: “rodovia da morte” e as lições são diárias com tempo seco e iluminação natural, mas parece que muito motorista não aprendem. Se na BR-101, que está duplicada e bem sinalizada, até com poucos buracos dessa vez, já não se enxergava nada por conta da chuva torrencial e corria-se riscos com o modo de dirigir de alguns condutores, inclusive caminhoneiros que passavam pela gente como foguetes com suas carretas carregadas, chego à conclusão que trafegar pela BR-470 é uma questão de necessidade.
Dizer que a rodovia não mata ninguém não é ignorar todos os perigos que poderiam ser amenizados pelas soluções de engenharia de tráfego, mas o comportamento dos motoristas pesa e muito! Dá para ouvir daqui alguns leitores comentando que isso não é nada perto dos perigos e riscos que correm diariamente fazendo trajetos longos o tempo todo sem terem como desviar da BR-470. É fato: uma coisa é você ouvir, ler e ver imagens de imprudência nas reportagens que nunca flagram o que realmente acontece na BR-470, outra é você dirigir por ela em condições totalmente adversas, principalmente nos trechos em obras.
Uma coisa é tomar decisões, assinar contratos e aprovar projetos para as rodovias de dentro dos gabinetes, sem dirigir e sem enfrentar os riscos da BR-470. Quem sabe fosse diferente se quem tem a caneta na mão passasse o que os motoristas passam diariamente. quem sabe não haveria tantos atrasos e a tal “rodovia da morte” já tivesse sido duplicada, melhor cuidada e sinalizada.
Mas a realidade não ficará diferente se o comportamento dos motoristas não mudar. Se basta começar a chover em via urbana para os acidentes que poderiam ser evitados passem a pulverizar as vias porque os motoristas ignoram a diferença de dirigir com tempo bom e em condições adversas, imaginem a indiferença nas rodovias e especialmente na BR-470.
Mais uma lição aprendida: evitar a BR-470 o quanto se pode ainda que para isso se tenha que dirigir alguns quilômetros a mais com segurança. BR-470 só em caso de necessidade. Mais um reforço para as lições já aprendidas: não confie nos outros motoristas, esteja sempre alerta, não se sinta menos habilidoso ou menos motorista que os outros por trafegar na velocidade da via ou até abaixo dela, principalmente na BR-470 e especialmente em condições adversas. A 470 pode ter sido batizada como “rodovia da morte”, mas é gente matando gente o tempo todo.
Márcia Pontes é escritora, colunista e digital influencer no segmento de formação de condutores, com três livros publicados. Graduada em Segurança no Trânsito pela Unisul, especialista em Direito de Trânsito pela Escola Superior Verbo Jurídico, especialista em Planejamento e Gestão do Trânsito pela Unicesumar. Consultora em projetos de segurança no trânsito e professora de condutas preventivas no trânsito. Vencedora do Prêmio Denatran 2013 na categoria Cidadania e vencedora do Prêmio Fenabrave 2016 em duas categorias.