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Márcia Pontes: O mais difícil da Educação para o Trânsito é querer ser educado

Essa é uma constatação que vale tanto para todos os cidadãos, inclusive aqueles que são gestores do trânsito nas cidades. A educação que tantas vezes se diz que falta aos motoristas que não dão seta, que não dão a vez quando solicitados, os que furam o sinal do semáforo, que fazem sinal de dedo e tantos outros exemplos tem tudo a ver com o modo como as pessoas agem em outros aspectos da vida. Mas, também com o fato de quererem ser educadas ou não! 

Sr. E Sra Pateta

Praticamente todo mundo lembra daquele desenho do Sr. Pateta que rodam nas aulas teóricas nas autoescolas. O filme é da década de 1960, mas cada dia mais atual! 

No desenho o Sr. Pateta é um cidadão exemplar, educado, bondoso, gentil. Mas, quando assume o volante se transforma, fica agressivo, egoísta, impaciente, se sente o dono das ruas. 

Na verdade, o Sr. Pateta que habita dentro de cada motorista não se transforma em função do carro ou do ato de dirigir. Ele apenas revela em sociedade o lado que fica oculto do público e que só a família e os amigos mais chegados conhecem. 

Basta sair de casa com pressa, topar com um ciclista nas ruas estreitas e ter que desviar, ter de esperar 30 segundos em um semáforo ou sentir-se o dono das ruas que ele começa a mostrar como age em situações parecidas na vida. 

O motorista e o monstro 

Na história do médico (Dr. Jeckill) e o monstro (Sr. Hide) um homem faz experiências no próprio corpo para tentar entender as ambiguidades “inexplicáveis” do mesmo ser. Transforma-se ou deixa vir à tona o que pretende ocultar em público?

Quantas vezes já não lemos em noticiários sobre certos políticos que em público têm fala mansa, são educados, cumprimentam, dão tapinha nas costas de todo mundo, tratam bem a imprensa e se dizem da nova “pulítica”, mas que ao serem autuados batem boca com os agentes de trânsito. 

Não param por aí: tentam dar carteirada, ameaçam ligar para o chefe do agente que ele mesmo indicou para o cargo, filmam a abordagem do agente ainda que correta e avisam: vou acabar com vocês no meu próximo discurso na Câmara!

Já não foi uma nem duas vezes que isso ocorreu em Blumenau e continua ocorrendo todos os dias em diferentes cidades pelo país. 

Outros Brasil afora que tentam alinhar o mesmo perfil de polidez e gentileza seguem pela contramão com discursos de indústria da multa ignorando a indústria dos infratores que atrapalham o trânsito, dirigem agressivamente e quando são flagrados se dizem os coitadinhos injustiçados. 

Na vida e na via

Aquele motorista que reclama que os outros não dão seta, mas faz a mesma coisa recusa-se a se educar para o trânsito. É como se dissesse sai da frente moleza que eu sou o dono da rua!

O motorista que utiliza a buzina por mais tempo que o normal na via como se xingasse o outro é aquele que na vida quer se sentir grandão gritando e alterando o tom de voz. Não poupa caretas, muxoxos e sinal de dedo. 

Aquele que ultrapassa onde é proibido, em curvas, subidas e sem visibilidade é como se empurrasse as pessoas da frente dele porque representam um estorvo. Na vida quando estão numa fila de banco tentam furar e no supermercado empurram o carrinho de qualquer jeito, atrapalham as pessoas, mas continuam se sentindo melhor do que os outros. 

O motorista quando é pedestre não fica esbarrando nas pessoas o tempo todo, mas quando assumem o volante se envolvem em colisões. 

Educação

Tem motorista que leva a falta de educação na vida para a via assim como tem aquele que na vida é educado, exemplo de generosidade, mas basta assumir o volante de um veículo para se transformar num treva.

Quando se pergunta a qualquer usuário das vias, motorizados ou não, o que mais irrita no trânsito a falta de educação assume o topo da lista, mas nem sempre aquele que aponta o dedo para o outro é educado. 

Quantos e tantos comentários inclusive nesse texto citarão a educação para o trânsito iniciando já na escolinha até a universidade como a única saída para formar cidadãos mais educados para o trânsito. Mas, e os cidadãos de agora continuarão fazendo miséria nas vias?

Nesta semana que passou três leitores da coluna me consultaram sobre autuações por infração de trânsito em que se diziam injustiçados e pediam ajuda para recorrer. 

O primeiro condutor dirigir faz 4 meses com o vidro do veículo quebrado. Caiu numa blitz, foi autuado e ficou indignado. A lei que muitas pessoas não querem respeitar tipifica como infração e os agentes de trânsito cumprem o que diz a lei autuando. A justificativa de que não tinha dinheiro não faz “derrubar multa” deste tipo. 

O outro condutor reclamou da autuação por fazer conversão proibida em cima de linha contínua amarela, onde tem curva, numa rua estreita em que os motoristas abusam da velocidade, uma ponte a poucos metros e passa ônibus. Foi autuado corretamente para evitar o acidente, mas o motorista não aceita. Daí dói mais. 

Finalmente, outro motorista ficou enfezado porque foi autuado por dirigir sem cinto e falando ao celular. Chegou a oferecer o triplo do valor das multas para encaminhar a defesa mesmo diante da fundamentação legal, de admitir ter cometido as infrações e da dificuldade de se derrubar um auto de infração desses. 

Daí quando você ouve dos autuados que eles sempre fizeram isso e numa foram “multados” vem a constatação: a maior dificuldade da educação para o trânsito é as pessoas quererem ser educadas.

A maior dificuldade é quando gestores do trânsito deixam de fazer o que deve ser feito para tentar educar as pessoas para o trânsito alegando que elas não querem ser educadas!

Parece que a importância e visibilidade ao compromisso que dizem que têm só aparece ao se  iluminarem nos holofotes de Maio Amarelo e Semana Nacional do Trânsito. 

Educação vem de berço para a vida. Para a via ser educado é uma tarefa constante tanto no plano pessoal quanto coletivo.  

Texto escrito por MÁRCIA PONTES

Márcia Pontes é escritora, colunista e digital influencer no segmento de formação de condutores, com três livros publicados. Graduada em Segurança no Trânsito pela Unisul, especialista em Direito de Trânsito pela Escola Superior Verbo Jurídico, especialista em Planejamento e Gestão do Trânsito pela Unicesumar. Consultora em projetos de segurança no trânsito e professora de condutas preventivas no trânsito. Vencedora do Prêmio Denatran 2013 na categoria Cidadania e vencedora do Prêmio Fenabrave 2016 em duas categorias.

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