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Trânsito: mais de 40 projetos de lei querem acabar com pedágio no país durante pandemia, por Márcia Pontes

A questão não é a arrecadação bilionária ou ter que pagar 4 vezes para transitar numa rodovia (pedágio + CIDE + ICMS + IPVA), mas motivos é o que não faltaram aos deputados federais que apresentaram, até agora, cerca de 40 projetos de lei para suspender a cobrança dos pedágios no país durante a pandemia da Covid-19. O PL 1499/2020 justifica que o manuseio de dinheiro em papel ou moedas facilita a transmissão do vírus; o PL 725/2020 quer a suspensão do pedágio para todos; o PL 1280/2020 beneficia apenas os caminhoneiros autônomos enquanto a maior parte dos demais PLs quer cancelas levantadas para veículos de transportadoras de alimentos e remédios.

As concessionárias e permissionárias do serviço de pedágio reclamam que o fluxo de veículos nas rodovias pedagiadas caiu mais de 40% durante a pandemia, que os prejuízos chegam a R$ 500 milhões por mês e cancelar a cobrança de pedágio colocaria a todos em dificuldades. O Ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, afirma que a medida é ruim, geraria mais prejuízos e atrapalharia a negociação de novos contratos. Quem será que ganha o cabo de guerra?

Dinheiro transmite o vírus

O dinheiro em papel ou em moedas é vetor de transmissão para o coronavírus. Essa é a justificativa de alguns deputados federais e senadores para propor a suspensão do pedágio em todo o país enquanto durar a pandemia e citam que seguem a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em São Paulo, já se testa um novo tipo de cobrança de pedágio por aproximação do cartão e sem contato com a maquininha de cobrança, além da já existente opção do Sem Parar.

Há deputados que querem suspender a cobrança de pedágio para todo o tipo de veículo e manter as cancelas levantadas por tempo indeterminado, enquanto durar a pandemia, enquanto alguns também já protocolaram os seus PLs para não cobrar pedágio de caminhoneiros que transportem alimentos, remédios e outros itens essenciais à população. A justificativa é de que baratearia os preços de alimentos, medicamentos e produtos de higiene e limpeza.

Não obstante, outros deputados protocolaram os seus PLs para isentar somente os caminhoneiros autônomos com a justificativa de que eles não têm as mesmas garantias trabalhistas dos demais. Por se tratarem de propostas de leis para o mesmo assunto, a tendência é de que os referidos PLs e os demais que sejam protocolados sejam apensados a um projeto só para que depois se apresentem ainda as emendas.

Ministro diz que a ideia parece boa, mas é ruim

Consultado em entrevistas a respeito das iniciativas dos deputados federais com a intenção de acabar com o pedágio no país em tempos de pandemia, o Ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, já adiantou que não concorda e que isso traria mais problemas ainda, quebraria contratos já firmados, além de atrapalhar a negociação de contratos novos. Isso porque existem novas concessões em vista até 2021: pelo menos, 17 propostas de concessões estão na mesa do Ministério de Infraestrutura e no Programa de Parcerias para Investimentos aguardando os leilões.

Ao todo, são 22 projetos em potencial, com extensão total superior a 11,5 mil quilômetros. Só em Santa Catarina as concessionárias cobrariam pedágio ao longo de 221 quilômetros da BR-101 e em 401 quilômetros das BRs 476/153/282/480/PR/SC. A BR-470 em Santa Catarina ganharia 455 quilômetros de rodovias sob concessão, a BR-290 mais 307 quilômetros e outros 544 quilômetros nas BRs 153/282/470/SC e SC 412. Em nosso Estado, são cerca de 300 quilômetros de rodovias federais pedagiadas.

Os bilhões em torno dos pedágios

Quando se trata de pedágio, todo mundo abocanha anualmente uma fatia em cifras bilionárias, não só para as concessionárias, mas também para o governo. Das principais rodovias do país, 21 estão sob concessão. Foram R$ 2,2 bilhões da fatia da arrecadação em 2018 com impostos como o Pis, Cofins, ICMS e Imposto de Renda. O governo estadual também recebe uma parte destinada à fiscalização e aparelhamento da Polícia Rodoviária sob sua circunscrição e também pela gestão dos contratos. Já as prefeituras cujos municípios cortam as rodovias pedagiadas arrecadam com o ISS-QN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza). Em 2018, foram mais de R$ 1 bilhão.

O sonho de muitos motoristas é que os pedágios deixassem de existir e que os governos fizessem a sua parte mantendo as rodovias transitáveis e bem sinalizadas, mas na prática, apesar da quantidade de impostos que se paga, parece que esse dinheiro nunca chega às rodovias brasileiras. Como o estado não dá conta e com a malha viária virada num queijo suíço, o estado “terceiriza” o serviço às concessionárias, que cobram por meio do pedágio para fazer o papel do estado. O motorista fica sem escolha e se quiser seguir viagem tem que pagar o pedágio. Em 2008, o Brasil tinha mais de 20 mil quilômetros de rodovias pedagiadas (9.708 quilômetros de rodovias federais, 10.999 quilômetros de rodovias estaduais e 38 quilômetros municipais), segundo a última atualização da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR).

Só para se ter uma ideia, a Confederação Nacional dos Transportes estima que para corrigir os problemas mais urgentes e promover a reconstrução, restauração e reajuste das rodovias brasileiras são necessários R$ 48,08 bilhões, sete vezes superior ao valor estimado pelo governo federal para todas as obras de transporte rodoviário em 2018.

Apesar dos PLs, há aval para concessionárias

Na contramão dos projetos de lei que querem acabar com o pedágio durante a pandemia, o governo federal deu aval para as concessionárias de rodovias federais pleitearem à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) reequilíbrio nos contratos e, consequente, reajuste no valor das tarifas. No entanto, as concessionárias aguardam a divulgação de outras medidas por parte do governo que as ajude a enfrentar os problemas causados pela redução do fluxo nas rodovias. De acordo com Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), a movimentação nas estradas do país concedidas ao setor caiu, nos meses de abril e maio, 44% e isso trouxe uma queda de 30% na arrecadação.

Ainda em abril a Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu um parecer que reconhece que as concessionárias estão tendo um prejuízo não previsto em contrato por conta da pandemia. E aí entra uma alfinetada política: o governo federal acatou o argumento das concessionárias de que a situação difícil em que se encontram é por culpa de governadores e prefeitos que decretaram o isolamento social.

Nesse cabo de guerra, de um lado estão os deputados e senadores que querem as cancelas levantadas permanentemente durante a pandemia, já que seria difícil aprovar um projeto de lei que acabe com os pedágios definitivamente, aliás amparados no art. 150, inciso V da Constituição Federal. De outro lado, estão as concessionárias, que querem as cancelas ativas alegando um rombo do qual dificilmente se recuperariam.

Dispostos a somar forças para puxar as cordas do lado das concessionárias estão o próprio governo federal, além dos estados e municípios que recebem uma fatia bilionária da arrecadação com os pedágios. Inclusive, o governo federal avalia incluir nos novos contratos tarifas de pedágio com diferenciação para rodovias simples e duplicadas.

No que será que isso vai dar? O leitor quer arriscar um palpite?

Texto escrito por MÁRCIA PONTES

Márcia Pontes é escritora, colunista e digital influencer no segmento de formação de condutores, com três livros publicados. Graduada em Segurança no Trânsito pela Unisul, especialista em Direito de Trânsito pela Escola Superior Verbo Jurídico, especialista em Planejamento e Gestão do Trânsito pela Unicesumar. Consultora em projetos de segurança no trânsito e professora de condutas preventivas no trânsito. Vencedora do Prêmio Denatran 2013 na categoria Cidadania e vencedora do Prêmio Fenabrave 2016 em duas categorias.

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